Até amanhã.
serei hospedeiro de micro fauna
até amanhã
lá depois de abrir portas e janelas
e para sempre fechar
desabrigarei minha memória
ordem de despejo à memória!
chorarás no vazio
no vento ressequido
racharás tuas vísceras até o pó
não lamentes tanto:
até o pó é algo que voa
Esperneia!
enquanto pernas tens
já te sedo em semi-sonho
te alimento de larva onírica
com minhas colheres furadas
cai mais no chão
do que em ti
para desculpar
sem querer
minha maldade proposital
lembras do homem de Vitrúvio em quadro que me deste?
uma pena
teus olhos estarem ausentes
para ver
a árvore que irei amarrá-lo
a dor do homem que esquadrinhado na moldura
( e como tu entendias de molduras !)
sem poder a fuga
queimará da própria inércia
e do meu fogo
prefiro queimar o que está preso
por gostar menos de matar
do que deixar morrer
lenha para isso?
tuas roupas que ainda me restam:
o fogo de fibra
alimentado com o pó
da furada colher
caído no chão
e sem ainda levantar vôo no vento
logo quererás ser
outro bicho que puder
caber no mundo sem jaula
já me traio
o que salva é a falta de propósito
já confundo minha memória com teu tu
hospedagem maldita!
confundem-se o cheiro de musgo da pensão e dos corpos suados pensionistas...
tudo fede a velho
e os vermes se otimizam por não terem narizes
Avise:
hoje não tem refeição!
já te dei a comida eterna :
o dispêndio de energia.
ouça tua barriga roncar
até o obssessivo som metal badalar incessante
dia
noite
e dia nublado
como os tiros imaginários e eternos
de velhos generais de velhas guerras
que já loucos
não dormem sem ser Napoleão
tateaste o vazio da liberdade?
já estende a fibra dos teus braços
para alcançar o fio solto que te presenteará
com tua última eutanásia?
desalojo
desospedo
tu
teus porcos
teus cães
num chute só
amálgama pobre!
erás tudo num só
e isso era motivo de garbor!
então vá de uma só vez!
não, não vá!
agora não...
falta uma coisa ainda
um selinho apenas...
pra carta grande:
meu chute.
despacho
desalojo
desospedo
e aviso:
hoje não tem refeição!
só eu como.
estás pronto para a epifania da eutanásia?
amanhã!
(que já é hoje - longa morte tua descrita)
como na Antiga hecatombe grega!
serão mortos cem bois
e quatrocentas patas
no susto que apaga
se flexionarão
para os corpos de pêlo curto ruírem.
e acredites (já rio) :
não há ruínas em paz
hoje
fechadas as portas
tu não és tu : é mais aquilo
perguntarás o que terei feito
com o cheiro forte dos corpos...
direi o cheiro das fezes das coisas vivas
como incômodo maior
que o cheiro na anunciante inspiração
e respiração
do húmido putrefato
gestação da vida
através de placentas mortas
envoltório próprio dos coveiros
( sim! tu és um coveiro insistente!)
insatisfeitos que o outro morra
sem levar deles
nada que os recordem
acredite:
até os coveiros são vaidosos.
Morres hoje
que é amanhã
e depois
porque não sabes morrer.
Deixaste para mim tarefa
que hoje completo
com serena execução.
olha bem...
observa com aquilina cautela...
por debaixo do capuz...
vês uma luz pequena com dentes?
é o meu sorriso
que te mata
sem precisar de consolo
desalojo
desospedo
desamo tudo para caber espaço
e hoje
que é amanhã
o exílio-pensão-cortiço
de mal aguentar
o próprio cheiro
pelo bem
fecha as portas
e aviso:
hoje não tem refeição!
eternamente
só eu como.
estou estarrecida com a força disso que acabei de ler... e ponto.
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