segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

o amor existe

o amor existe
quando não se insiste
em amar
o amor
do outro

existe
quando não se insiste
em ter mão
dedo
boca

por
poros

:

o amor
é um corpo
sem órgãos.


é
pequeno
e para os que gostam de espelho
um caco bastaria
para se ver.

existe
quando se mata uma criança
e nascem duas no lugar
no que insistia
em envelhecer
o amor é it
por gostar do que ama
ama o impessoal do mundo
e dá o que sobra
ao intruso acaso.


O amor que não insiste é o intruso acaso aceito.

repetidas vezes...
mesmo quando se que
bram os espelhos i-mitados.
do mítico
falhado verdade:
existe antes nos que podem amar as folhas
e cheirar flores por cheirar
destemendo a zanga
por afetos de colméia
existe antes
no
mer
gu
lho
fresco
no olhar desatento
adorador do todo
antes de amar.

 existe na segunda-feira
sempre sonâmbula
se na primeira e sétima
pós-sexta
atritou-se o gostar
aparece tímido
em rimas pisadas como estas
de quem já amou desamado
nesse jeito mal contado de experimentar

:

e nos ‘ar’ de amar, ralhar
és de término!
combinados em rima
busca apenas uma familiaridade
com esse par
existente
de nunca encontrar
som igual
surdo
sem saber
nas dissonâncias perdi o procurado
por não crer na meditação do amor
como a equalização
de dois sofrimentos.

:

não
caros
ninguém procura amor
por alegria

.

o alegre é antes o rei do acaso
e esse não procura
nem permite ser procurado.
pra curar
o que não se cura :
sintoniza uma música suportável.

acaso
proposital
potente
desejoso
de
cru.
                                                                                                                              

contradição do arbítrio livre
pela força de se auto-narrar
você como teu
eu
e às vezes, só às vezes,
alguém dança
mas é sempre
em gelo liso.

não se ama no fogo
nem embaixo da terra
amor de terra
procura minhocas
que procura húmus
adubo de coisa morta


e o que morre
são as paixões.


o amor injeta
o pior vírus:
outro amor
que cresce sem matar
o hospedeiro

morre-se de cólera e não de amor.

as coisas se matam:
o que morre são os mitos
e o amor é um Deus
inventado pelos médicos
que contraindicam a solidão.


o amor é antes o que perpassa
não se atira em objetos
nem desmaia nos braços de sujeitos
é fleuma combinatório
existente apesar



de.





é patinho feio
por lutar contra tédios
em mundos de desistências
ânima sem compromisso
de reavivar
desconhece deveres
existe
sem estar
e quando
(em tempo triste)
existe muito
sem estar
vira
saudade



ele é  um it

:

para eles


há de ser um metal vagabundo
a doce condicional
de anteriores prisioneiros soltos
por bom comportamento

entre o amor e o reino
ficaria com o reino

e amaria outro mundo.

4 ou n

Creio ter com o desconhecido uma paixão em comum: acaso... Volto depois de dias sem funil. Era dique. E continuo pelo que às vezes racha. Tenha paciência. Já disse: experimentaremos o espaço. Deixarei que você toque o que há atrás do pensamento. Cheire o espaço no lento. Todas as metáforas que pularem de nada terão de imagético. É vivido e pensado: assim. Deixo fluir o que outrora foi pensado para ser memória. Acabou a luz. E isso não é metáfora de trevas líricas. Escrevo, faz calor. Acabou a energia. Vou acender um sândalo. Careço de concentração para a naturalidade. Nós não merecemos todos os nossos inventos. Há dias queria te contar uma brincadeira que fiz com aranhas. Já se deixou ser hipnotizado por grande teia? Por grande teia que refletia o sol? A cada movimento de sim e não que eu fazia era um lampejo, um constructo de lampejos. A arquitetura para presas que também brilhava E brilhavam também os olhos da aranha. Acho que eram verdes e orgulhosos. Olho meus quadros de cabeça pra baixo. Ester limpou e colocou-os cuidadosamente de cabeça para baixo. Como a aranha, tenho também olhos orgulhosos. Penso no despertar de um senso estético, mas isso é bobagem. O contente é pensar que se me atraísse o figurativo, a mimética inválida, pintaria árvores ou rostos que dificilmente acabariam de cabeça para baixo depois de uma limpeza feita por mãos que conhecem a vida mais que os critérios plásticos. Gosto de coisas plantadoras de bananeiras. O avesso, a cabeça e o para baixo. Vale mais o para cima e para baixo nada revelador. Tenha paciência. Não iremos a lugar algum. Ainda não me arrebatam as histórias. Não me brilham as ficções. Sinto o vôo de asas. Mas por enquanto isso é fisioterapia de penas. Talvez te dê o quisto. Por enquanto, só eu como. Ponho uma linda mesa e arranjos brancos; a vista é para o presente. Não sou um contador de causos, me interessam outras mentiras. Preciso parar e não quero. Aflige saber que preciso sair e palavras podem cair pela rua. Ou se pendurar em semáforos feito acrobatas hipnotizados por um verde luz de permissão. Escrevo com pressa. Desliguei o chuveiro mais cedo para te escrever. E tudo isso de nada adiantará a não ser para exercitar minha falta de finalidade. Fim? Há. Não se perder na manada. Eu que matilho. Conversarei agora com uma pessoa que pago para me ouvir. Um aluguel de ouvidos onde minha sanidade é fiadora. Você me ouve: sem ser pago. E acrescento mais ainda ao meu egoísmo e leviandade: sonho todo dia quando pagarás para ouvir minha voz. Que é tua, espelho d’ água! Lago torto! Entre o amor e o reino, sempre o reino. E amo outro mundo. De você também me desfazeria por tis! Acidez me chega na boca com frescor. Não sei porquê. Ando com tanta tara por limões que outro dia no palco disse que era ovo. Não rabisco aqui insanidades... O it traz do cotidiano o fantástico. Aranhas piscam, limão vira ovo, pitayas anúncios proféticos... E morreram as metáforas: o impacto que à toa treme. Chupo do dito pós- moderno a reificação do presente. Mas recuso os fragmentos por ser trans. Ou alguém já viu um fragmento de fluxo titubeando por aí?

sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Pensão fechada por motivos de força menor

Até amanhã.

serei hospedeiro de micro fauna
até amanhã

lá depois de abrir portas e janelas
e para sempre fechar
desabrigarei minha memória

ordem de despejo à memória!

chorarás no vazio
no vento ressequido
racharás tuas vísceras até o pó

não lamentes tanto:
até o pó é algo que voa

Esperneia!
enquanto pernas tens
já te sedo em semi-sonho
te alimento de larva onírica
com minhas colheres furadas
cai mais no chão
do que em ti
para desculpar
sem querer
minha maldade proposital

lembras do homem de Vitrúvio em quadro que me deste?
uma pena
teus olhos estarem ausentes
para ver
a árvore que irei amarrá-lo
a dor do homem que esquadrinhado na moldura
( e como tu entendias de molduras !)
sem poder a fuga
queimará da própria inércia
e do meu fogo

prefiro queimar o que está preso
por gostar menos de matar
do que deixar morrer

lenha para isso?
tuas roupas que ainda me restam:
o fogo de fibra

alimentado com o pó
da furada colher
caído no chão
e sem ainda levantar vôo no vento
logo quererás ser
outro bicho que puder
caber no mundo sem jaula

já me traio
o que salva é a falta de propósito

já confundo minha memória com teu tu
hospedagem maldita!
confundem-se o cheiro de musgo da pensão e dos corpos suados pensionistas...
tudo fede a velho
e os vermes se otimizam por não terem narizes

Avise:
hoje não tem refeição!
já te dei a comida eterna :
o dispêndio de energia.

ouça tua barriga roncar
até o obssessivo som metal badalar incessante
dia
noite
e dia nublado
como os tiros imaginários e eternos
de velhos generais de velhas guerras
que já loucos
não dormem sem ser Napoleão

tateaste o vazio da liberdade?

já estende a fibra dos teus braços
para alcançar o fio solto que te presenteará
com tua última eutanásia?

desalojo
desospedo
tu
teus porcos
teus cães
num chute só
amálgama pobre!
erás tudo num só
e isso era motivo de garbor!
então vá de uma só vez!

não, não vá!
agora não...
falta uma coisa ainda
um selinho apenas...
pra carta grande:
meu chute.

despacho
desalojo
desospedo
e aviso:

hoje não tem refeição!
só eu como.

estás pronto para a epifania da eutanásia?

amanhã!
(que já é hoje - longa morte tua descrita)
como na Antiga hecatombe grega!
serão mortos cem bois
e quatrocentas patas
no susto que apaga
se flexionarão
para os corpos de pêlo curto ruírem.

e acredites (já rio) :
não há ruínas em paz

hoje
fechadas as portas
tu não és tu : é mais aquilo

perguntarás o que terei feito
com o cheiro forte dos corpos...

direi o cheiro das fezes das coisas vivas
como incômodo maior
que o cheiro na anunciante inspiração
e respiração
do húmido putrefato
gestação da vida
através de placentas mortas
envoltório próprio dos coveiros
( sim! tu és um coveiro insistente!)
insatisfeitos que o outro morra
sem levar deles
nada que os recordem

acredite:
até os coveiros são vaidosos.

Morres hoje
que é amanhã
e depois
porque não sabes morrer.

Deixaste para mim tarefa
que hoje completo
com serena execução.

olha bem...
observa com aquilina cautela...
por debaixo do capuz...
vês uma luz pequena com dentes?
é o meu sorriso
que te mata
sem precisar de consolo

desalojo
desospedo
desamo tudo para caber espaço
e hoje
que é amanhã
o exílio-pensão-cortiço
de mal aguentar
o próprio cheiro
pelo bem
fecha as portas

e aviso:
hoje não tem refeição!

eternamente
só eu como.

sábado, 22 de janeiro de 2011

Grande amiga minha
e da graça
contou:

a gente nasce de (n) ovo

3 ou n

Implodi meu corpo. Dentro para fora. E as pessoas observam na calçada. Não há poeiras, nem a tosse de ar viscoso que resiste entrar. De concreto : um nada. Como seria um castelo de róseo mármore ruindo? Também não sei.

Acho que tenho febre. Ou é um pouco de sol praiano guardado em mim. Fazia tempo não lhe escrevia, invisível leitor. Para grandes perplexidades não há funil. Não goteja palavras. A escrita é a dose homeopática da depuração. Cada palavra um micro bálsamo, como aqueles moradores de dentro da aloe vera. Pinga uma gota que é minha e sua. E talvez mais sua do que minha quando as teclas presenteiam as gotas de asas. Meu funil continua ineficiente, talvez por isso sinta minha cabeça como uma pista oval. Digo já. Não chegaremos a lugar nenhum. Este instante é aterrisagem. O it é o fim do que começa sem finalidade. E quando digo morte, digo morte. A morte do amor burguês já me serviu em priscos romantismos. Agora falo de morte como os cadáveres vêem o capim por baixo. Poderia. Mas não vejo capim. Vejo o mundo por baixo e é sobre isso que quero falar. Sem morbidez. Se vejo morte, vejo vida, vejo céu e mar. Vôo e mergulho. Uso o binóculo da morte. Tudo me é perto e de fronte. E é só com esse binóculo que se enxerga o devaneio da vida. O que há perto vira apenas o halo da coisa e o longe a distância segura de quem pode enxergar as explosões do devaneio sem a urgência de correr dos destroços que perseguem alvos. Perseguir, perseguir... Será que consigo te transseguir? Já não persigo. Sobre isso o grande Acaso me contou. Acreditei. Por não ter verdades a ele me abri como arco-irís e morros. Paro aqui. Já me traio.

Me pergunto... Como se esculpe uma menina vendo se vai chover? Quero mais argila. E Clarice. Para onde posso te levar que não seja a minha casa? Gosta de ágoras ou de claustros? Então vamos treinar tiro ao alvo. Tiro de flecha. Sem pena na ponta. O que será que há de comum entre a flecha e o ovo? Prefiro ainda falar de ovos. E faróis. Flechas são rápidas demais para mim agora. Farejo um gás letal rastejante. Chamariz tem o sangue envenenado.

Nasci de novo e além de descalcificar as cascas me sobrou a embriaguez suave de quem bebe o acaso. O instante catártico? Não. Não há transcendências quando nasci de placenta minha. Como o inanente, tenho o acaso entre os dentes. Pesa-me o instante como uma coruja pousada no ombro. Choro. Viagem pensada desde criança. No cedo já queria estar lá. E cheguei, estou. Sabe quando se tem viagem velha planejada? Paisagem tão quista que mareja os olhos? O êxtase do perplexo. Minha água é de quem vê as pirâmides do Egito : o túmulo e a geometria. Choro porque agora não quero voltar pra casa. E não poderia. Ficarei para sempre no Egito.

Perdi a companhia. Mas ganhei a herança. A mesma geometria dos túmulos é a que vê a dança dos astros. Encontra Vênus e guarda gatos empalhados.

Empalhei o gato da procrastinação. E ateei as expectativas. Sem guardar aguardo, a penas, vida. Ela é a única convidada para depois do baile errático dos instantes deitar fria e arrepiante no túmulo triangular. Do arrepio donde se subtrai o medo: feito gelo e sexo.

-

Meu escudo é metal retorcido
arma urgente de remendo para prisioneiros em rebelião.
caco de vidro vira faca
a corda do que foi lençol
pois o sonho já não sonho:
é instante
dopante
por si
só.

Tocam sirenes
e fogem com o improviso em punho.
Fogem?
Ou vão de encontro?
Questão de ser carcereiro ou presidiário...

Correm pela felicidade:
é instante
dopante
por si

-

"Antes a morte que é só minha do que as meias vidas que me roubavam. Vem, tente roubar o nada, gatuno! Roubarás de mim o quê? Já nada tenho do real que reconheces!"

Raptarás meus instantes?
Nem esses são meus! Eles são sem mim.
Esquadrinharás o ar feito ingênua janela?
Aprisionarás o fogo? Consome o que prende...
Tão bom nada ter e poder andar pelas ruas noturnas e silenciosas sem medo...
Roubarás o que? Minha cabeça?
Essa é demais para ser carregada e não agüentarias tal peso.
Fura hoje qualquer saco. Arrebenta tecidos.
Como o caos arrebentou minhas fibras de dentro e antigas defesas.
Sou o caótico de pernas,
hemato experimental:
seu olho te daria náuseas ao me acompanhar.
Nada tenho e dos meus amigos você correria.
Ou te amigarias com o morte?
Brincas de fazer sumir o que é dos outros
Eu brinquei de morrer e morri.
Fiz sumir o que era meu.
E faço aparecer o que ainda não há de mim nos outros.
Roubarás o que de um farol?
A água circundante?
Onde esconderias o mar roubado?
Teus baús de dentro da terra
fariam brotar rios.
O que é nascente sempre denuncia.
Do mar enterrado jorraria
sem delta a tua prisão.

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

2 ou n

Hoje foi um dia de tenras revelações, me amiguei com a morte depois de Vinícius. Convite irresistível aquela tenra velhice. Gargalhada que sacode o corpo todo, relembrava Chico. Falo como conto amigos, não estranhe. Não é pedantismo. Nasci intimo e isso causa algumas confusões. Faz do meu carinho às vezes rede maldita. Sou intimo e longe. Quero usar cada vez menos essa tecla que volta e apaga. Vou te dar tudo. Ou fazer você crer que me tem mais da metade. Não sou ar, adianto. Minha alma é pesada demais. Sou fogo leitoso de sândalo queimado. Purifico. Curo. Já disse não saber escrever e pintar. Sobrou algo: eu curo.

Curo errante por nunca ter deitado com feiticeiras. Ou adorado magos, apesar de já ter me vestido de um. Era carnaval, essa mágica não conta. Falo de catálises e não de dispersões. Não sei se por preguiça ou intuição talvez não possa detalhar os encantos. Mas hoje tive que curar minha mãe. Tive. Coisa aguda. Grave só para minha depuração.
Cada cura alheia para mim é um rascunho de auto cura. Brinco com a minha morte ancestral animando assobios de vida em música.
Pintei as palmas de roxo e a ponta dos dedos de vermelho. Quando olhei o contraste ganhei outra mão. A ponta vermelha das palmas espalmadas viraram unhas carmim. Era uma senhora antiga eu de mãos ao contrário. Confesso meu espanto pelo novo. O poder da cura é sempre novo e me vem do invento da intuição pronta. Há de se captar a vontade dela. Revoltosa borboleta. E assim me vem cada nova etapa do encanto a seguir: do improviso cristalizado, âmbar de intuição. Há de haver lua também. Sem ela minha elétrica é anônima. Ali não posso inventar nomes.

Vou pausar ( ou pousar ? ) agora, leitor. Só pulam coisas brancas na minha mente agora. Quero ofertar o transparente e o colorido. Fumar.

Lembrei agora ter cantado para a caneca de chá. Falei fogo de cima.
Acho que estou meio cansado dessa besteira de escrever, mesmo sendo besteira. Que é na brincadeira que a gente mais cansa. Todo mais é sacrifício, não é cansaço. É no jogo onde mais se dá. O resto é teatro ocidental.

Acho que me veio o lampejo da minha primeira história de ficção da vida. Que as de criança não contam. Todo poder era ficção por não haver ainda vida. Aquilo era o transversal suspenso, gasoso levitante , antes do ser e do é. A vida começa quando a crueldade de outrem nos rapta a inocência. O inicío da história é um cativeiro. Chamariz era um rapaz que tinha o sangue envenenado e se torna um revelador. Diz a mística sobre si haver de encontrar quatro homens e uma freira vaidosa. Os dois segredos de si para expurgo da voz precisavam ser revelados e tudo tornar formato transparente. Estamira havia lhe contado sobre o trocadilho e nesse dia ele desvirou criança. E agora tinha três casas e dois segredos para revelar à quatro ânimas o que lhe queimava o sangue. Faltou a freira vaidosa. Uns para roubar sua sensatez até xingavam seu ofício de psicopedagogo. Ela era. Mas não havia contado para ninguém.

Traí aqui minha proposta inicial, minha brincadeira primeira. Escrevia com o que havia a frente do pensamento, o peneirado pela ilusão do raciocínio. Antes escrevia medusa. Agora costurava ocorrências. Antes o fluxo era clara sombra por trás do pensamento. Queria lhe mostrar o pipoco da ficção. Agora breve que passou, o estouro cínico e urgente de pequenos cogumelos brancos. O toque curto de lúmen que dá vida à personagens. Temos desvantagens, leitor. E uma das suas desvantagens é o seu desapego de mim. Você é um dos muitos pares de olhos que se aglomeram feito anêmonas no fluxo corrente da água eriçante, dançarina fresca dos tremores que dão a palavra. Sem oferecer ouvido. Não te ouço. Somam a tua voz enormes outras em um plasmado ruído. Um zumbido de ouvido quando brevemente em diferentes alturas. E eu para você sou um, desgasto sua imaginação. Por você não posso ser-lhe além de um só. O desdobrado em tantas dúvidas até acabar em ser você mesmo. Botará em minha boca o não dito e me acusará de suas próprias contradições. Disso eu sei bem. Como acredito piamente em ovos e cura. Não para que tenha medo de pisar. Mas para ensinar como esperar vidas. O perplexo nascente quando do vazio faísca raios. Acolha esses personagens como o metal acolhe raios. Trema abraçado e junto. Sou uma borboleta que aprendeu o movimento de remanso das lagartas. Anda como se a maré estivesse em si baixa e cheia, baixa e cheia.

Isso também é seu mesmo que não sacie.

sábado, 15 de janeiro de 2011

Elétrica 1 ou " Do cotidiano fantástico"

A mirra tem sido meu transporte favorito. Talvez as teclas sejam a salvação da minha descoordenância, velocidade entre o dedo e o pensamento. Deixo agora fugir o é que é ser. Penso que as ervas estão na gaveta e procuro uma bacia que possa ser contaminada. Escrever aqui é poder. Uma brincadeira oculta. Uma folia mística de neurônios e elétrica. Traz culpa também essa linha. Derramei o dia pensando nos temas que sou eu. E os alagamentos de fora? Me perguntei hoje o dia inteiro. É engraçado pensar na sua condição de leitor. Esperto ao contrário eu escrever que estou com ervas atrás de mim e fazer você ver um jardim de pés empoeirados. Falo em ervas, sim. Mas estou com malva quente no cú. Li que cura abscessos.

Olho para as cores da paleta. Feia mistura faz brotar quadros patéticos. Não se já falei isso. Mas além de não saber escrever, também não sei pintar. E faço as duas coisas. Elas não tem que ser. Elas já é. Elas já unas no indivisível eu. Elas onde me estouro. Elas onde sou beira. Escrever é a anti-loucura do retroceder. Alquimia de tempo. Contração e descontração para fazer caber no entre criptografadas sombras do que há por trás do pensamento. Só cheguei na sombra. Ainda. Cheiro a malva quente. Tem cheiro de guardado amargo. É como se ela por trás o velho puxasse o velho. A afinidade dos amargos, o segredo do meu corpo rompido pela voz da erva que chama. Leitor, se enlouquecesse ainda mais meu cotidiano você mais me freqüentaria? Você é uma criança que gosta de casa de espelhos?

Já começo a inventar motivos para você gostar de mim. Tenho que parar. Não estou disposto hoje a inventar pensamentos. Chutei alegorias. Também quero o claro fluxo. Não quero turvar águas para ser visto profundo. Sujo não é profundo. Vago pelo desejo de ofertar minha fome em troca da sua comida. Tenho que parar. Sem inventos. Vou ver a malva. Ela tem pêlos. Num manual acabo de ler: “ quando chove estas flores choram, ou seja, libera um liquido castanho que faz nódoa na parede e no tecido”, assim falavam sobre os adornos da malva. Fiquei sem entender a parede. Ela nunca falou comigo. Malva é amiga do clima ameno.




Não queria que você me lesse para passar o tempo. Mas escrevo para passar o tempo. Faço pedidos egoístas, é bom saber. Peguei a folha pelo rabo e parecia um camundongo.
Escrever já é a tentativa maga no tempo. A malva coça reto. O velho tá puxando o velho. Amargo guardado com amargo guardado. Isso cura? Arde. A malva é teclado.

É claro o olhar de lis. O clã ri se. Gargalha se se é no it. Sabe que está comigo porque me convidei. Ela gostaria de me ver assim: escrevendo de bruço. Bruxa, teleguiava sementes.

Vou ligar o marimbondo condicionador de ar. Zumbido seguro sempre nina. Inseguro é tudo que não é robô. Homem sanguíneo, o que dirá o trocadilho? O meu sangue pesa mais agora. Penso em dormir. Ou durmo para pensar? É taça cheia, taça vazia, taça cheia, taça vazia... até me embebedar. Bêbado, acordo. Vivo trôpego do meu sono. Desperto para a vida justamente no sonho. É lá onde sou impossível e me ultrapasso. O sono é um it de morte aceita. Na vida sou imortal água-viva. Minto. Ainda me falta correntes para ser água-viva. Mas também não sou água morta. Cheira amargo. Sou dono de ostentados aromas. Não desapeguei do olho outro, sei bem. Ando pelo debaixo aquoso como se o substrato me desse arrepio. E cada arrepio é um passo. Cada arrepio, um passo. Cada... Posso ser estrela do mar? Eu respondo: sim. Já chamaram água viva de hermética bruxa, terror dos ginasiais. Só posso ser estrela do mar. E isso facilita, e muito, seu trabalho de voyeur de mim. Quero ver se você ganha do meu eu em olhar pra mim sem piscar o olho. Pronto, já piscou. Que aqui eu sou o dono do tempo.

A senda

pintei sidartha
na janela
parede queria roçar-me

tudo de música era mantra
mãos amarelas e roxas

achei que sidartha era
amarelo e roxo
é pra mim o que foi
agora e é
o espaço entre o sono
profundo
e a vigília inebriada
do apagar lilás
cantava próstata
ritmo vulcânico
trepida corpo
reavivante raio

reaviva
reaviva
reaviva
reaviva
morre enorme
a mente
o prateado
dor se olho aberto

corpo refaísca ânima
roxa
nas mais secretas microdireções

sou água trépida de rio
envolta por si
eriçada
de frescor arrepiante

o manso em movimento
de veloz elétrica

o que não cabe
continua
reaviva
reaviva
reaviva
reaviva
e morre enorme

agora em grave tambor

onda profunda
sem vela que faça boiar
ou a senda
profunda

cama roça
eu nela
profunda
ruído é mantra
fecunda
o universo
vermelho
gozo em mim.

sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

-eza ou " Para o mártir de cada um"

Para o sofredor o martírio é recurso, continuum da justificativa dos erros próprios. O sofrimento perverso dos que se abstêm de alegrias severas para cobrá-las em oportuno momento. O deixar sofrer é a garantia do poder errar mais. A vaidade dos que agüentam cruzes pelo espetáculo da breve demonstração de resistência. E quem não há de parabenizar um resistente? Ah, esse mundo de desistências... Enquanto o sofrido trabalha pelo respeito ao seus luto s, o sofredor se vivifica com a atenção dos desistentes. E ver o outro sofrer também é sempre uma possibilidade de se saber sofrendo menos! Essa é a acolhida. De estar sobrando em si a suposição do que no outro falta. Legitimadas pelo régio dar e receber, para muitos, estes são os melhores amigos. O sofrido é o meio do transversalidade daquilo que machuca e existe. Ora atravessado, ora a salvo, é o humano errante onde há o sobrevivido tentado. A planta da cidade, o formigueiro, os binários governantes... existem no machucar sempre possível da inconstância. Sobretudo no martírio sofredor o corpo inseguro faz emergir a vaidade. Há os que medem amor pela resistência do poder sofrer por ele. É justamente aí onde se acham livres. Se há liberdade para o sofrer insinuante de morte, qual Caminho para a liberdade que não pode ser percorrido? O teatro é a liberdade do duplo e abundante sofrer. Do resistir sofrer mesmo no encontro entre o que há de sofrido a ser mascarado e o que há de máscara a ser sofrido pelo dono de uma história que existe apesar do ator. Se o pensar é bastante para nos fazer humanos, o querer ser pensado nos faz humano à exaustão. No peito do sofrido a flecha estilhaça a carne, espirra. Estanca. O sofredor não importando cem flechas a atravessá-lo sangra sempre pela garganta. É preciso relembrá-los de que o grito em si não é a dor. O sofredor é poeta. O sofrido, o cacto de um poderoso sertão. O calor só mata os desavisados que não carregam água em si. O sofredor é poeta porque finge, não é? Dá-se roupas coloridas para o que não tem corpo e perpetuam o trapo a ser sujeira. A trajetória até o fim do tédio sempre salva os que em nada acreditam. Para o pessimismo o sofrer é a redundância do ingrato dar e receber. Para o sofredor o aclame do sudário. O mistério do que surje depois do acreditar-se limpo. A vingança – apogeu do tédio do ato sofredor- é a projeção do que não pode ser sofrido só. A escola abrigo dos alagados. O medo do eco na solidão é o tamanho incrível da voz triunfante do abismo vaidoso. A ciência da consciência , a filha mais que pródiga, que retorna com a mensagem da pequinês de todos os atos contra o que não morre e nem cresce de baixo para cima.O sofredor se afoga em poças. Outro bebe mar e rio para não cansar o corpo do sal. Sofrida é a grama apesar dos bois. O sofredor é árvore grande. Com bromélias, muitas bromélias... O belo controverso do ingenuamente acreditado parasita pela sua destreza de fixar. Sombra... todos querem sombra. Se soubessem onde vende os cantis para a sede de mundo fariam filas. Esperariam horas, anos... e seriam aplaudidos pela sua resitência. O sofrido é tão lobo quanto gato é sofredor. Um viva rouco para os que pulam de precipício, comovem e caem de pé. E a condenação dos lobos fornicadores de solidões. Sofredora é a lua, que convence o sol de conceder-lhe licença de dia em dia. Mas pegando o sol de saída, insinua humilhação e lhe pede um pouco de luz. Nos calorosos argumentos (porque sempre há calor afora o pedido) culpam até as estrelas pela criação da distinção entre tudo que brilha e o que é ofuscado. Quando só existir, na sua importância, bastaria. O sofredor é mágico, ruído por truques, auto ironia do nunca poder ser deus. Finge o que some por não saber extinguir. O sofredor chora em vulgares ombros. O sofrido narra os pesares do acaso; o dar forma a dor é distrair-se dela. Não há melhor morte para uma dor pulsante do que um sonho realizado. Há horas em que não se quer ser o próprio corpo. Piedade do corpo no tédio ritual do fim da destruição. Nada acaba se é conhecido. Sofredor é o homem do saco. Finge ser mendigo e rouba : preferência por vidas pequenas. Praguejar alguém para o sofredor é um bem memorável. O mal nunca é feito por, nem contra, humanos. Existe em milhões de fluxos que nos antecede. Se reproduzir o mal é a gestação do descontentamento...O que se diria do mal feito a vida pelos vulcões e gases que nos pré-existiram? Os crentes da ciência e suas bocas cheias diriam “evolução”( obviamente e a propósito...). Nem os mais exercitados e crentes pensadores admitem a experimentação do universo. Metrificam inconstâncias por pura distinção.

Beira

Penso em escrever cartas para a morte. Penso que não devo morrer. Penso que vou morrer. Mas quero descartar a necessidade urgente desta prova difícil. Há infinitos meios de se aprender uma coisa, mas a cartilha mortuária é surpreendente. Mítica. Irei procrastinar a esfínge? Não queria ter de viver à beira, num exercício atencioso de equilíbrio. Mas assim, de qualquer forma, eu já vivo. E o pior : desatento. Por isso este genocídio já dura mais de vinte anos. Sigo empurrando um a um. Ora finjo brincar, como uma criança cruel joga um pedaço de graveto no abismo e espera ansiosamente o pulo ou a vida do cão. Ora minto. Digo “ você foi punido, vamos por aqui...” E quando perguntam sobre o capuz preto, desconverso. “Me acompanhe até o calabouço”. Mas a prisão é lugar de meias mortes, não atende expectativa. Pego lentamente pelo braço, com a pena da cegueira quando encontra rua, sorrio os lábios que parabenizam mães e rebentos. Atiro cão, capuz, cego e rebentos vazio à baixo. Reservo as mães. Ouço o grito de tudo com olhos de fogo de artifício. Passada a catarse, candidamente enfio palavras na mãe. Digo que volte para casa dada a pecha de absolvida. Sem contar ter mandado queimar sua casa e tudo que mora, para que essa morresse pelo assassinato da suas bússolas e ,tonta por ser apenas o que tinha, rodar, rodar, rodar. Cavar vales com os pés, fundo até onde a voz não trepe. As coisas se matam. Quem morrem são os mitos.

Mas viver à beira, Morte? À beira? E mar tem beira? Ele é grande demais pra ter beira. Quem acha nele beira é porque em dois se desdobrou e não sabe ser ilha. Talvez ninguém suporte ser envolvido todo tempo. No dia em que acreditei que praias eram poeiras de montanhas talvez quisesse ser beira. Hoje mais me quero farol. O aviso do anti-beira. O aviso das pedras insuportáveis para o casco. O aviso da beira que não pode ser, mas existe : a contragosto dos marinheiros sonolentos. Talvez , Morte, você esteja me empurrando para uma insônia infinita. Nunca havia pensado que morte e vigília combinassem. E não combinam. Você, Morte, também abre olhos.

Já há tanta coisa morta de falsa vida que se meu sangue estiver envenenado será o veneno o meu triunfo. Triunfo? Já me tomam os ares heróicos. Talvez queira que cada vez que apontem a minha doença seja um leit motif para eu-farol iluminar todas as outras. Mas sem mostrar caminhos. Farol não mostra caminho. Isso é coisa de estrela.
Farol é a prévia do insuportável. Instiga outro caminho. Torna urgente outro caminho. Ou debruça luz no que pode ser a morte.

Ao não te querer, sinto minha intuição traída. Ela sabe que vou. Só não queria que os outros acreditassem que a minha viagem será (em) breve. Tenho medo de, por maus ouvidos, eu acreditar. Medo, medo... Medo dos outros. Expurgado, já não tenho de mim. Não tenho fome de coisa morta. Só como o que frutifica do mim, também universo de brotos deificados. Já não tenho tanto apetite, sei da raridade dos frutos. E da abundância das coisas mortas. Mas o fruto também já não é parte morta, Morte? Ou é falso morto porque tem a esperança da semente? Escrevo banalidades... Mas estou à beira, e quando assim, o esquecido é desperdício. Sei que isso encheria até a boca os ouvidos de qualquer um e acho que você de certa forma me entende. Ou ao menos, muda que é, desta forma faz acreditar. Acham que você é contagiosa e pouco conversam. Afinal, um monólogo incessante para que você se afaste, como que assustada por mantras folclóricos, não pode ter sido nunca uma conversa. Até oram contra você! Cristo foi ao seu encontro e te enganou. Ele que podia ter morrido em paz (já que não tinha pecados), resolveu morrer brigado com você. Quis tirar teu gosto em escolher e fazer do teu ofício uma incessante repetição. Cristo quis te ver morrer em círculos. Disse que morria por ele e por todos os outros! Quis tirar seu prestígio de ser Morte e ainda cobra caro por isso sem nunca ter lhe dado um centavo. A cruz era seu direito autoral, Morte! De quantas maneiras você já não havia visto aquilo. Mas não era o filho preferido do Senhor e nunca ninguém havia cobrado tão caro por aquilo. E sem ninguém pedir o sacrifício! Uma charlatanice, só. Parece cartão de banco chegado sem pedido prévio. Garanto, Morte, a mim ninguém perguntou nada. Agora na beira, de nada adiantaria. Nunca adiantou. Só atrasou. E nem atrasou tanto assim, já que cá estou e também nunca pensei a nossa conversa como coisa que viria tão cedo. Talvez por isso seja muda! Foi traumatizada...Eu também estou traumatizado. E mudo. Mas pelo menos posso escrever o que há atrás do pensamento e reviver a cada palavra onde me reconheço. Ou te reconheço?

E você pra quem escreve? Qual é a sua letra? Sabe algo de fogo e fumaça que ainda preciso compreender. Me sinto preparado. Para ser seu amigo. Mas isso não quer dizer que você vai me levar pra onde você bem quiser. E sei que os caminhos são muitos além do céu e do inferno. Se choro, choro por preguiça. Mudar itinerários dá trabalho.

segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

A dor embranquece

A dor embranquece.

não é preciso chorar
se o fim são os outros olhos
vejo entre a porta aberta
alguém espiado por um longo caminho
bate à porta
no impacto de assustar
mal sabendo ser esperado
nada assusta
só dôo
sem nada doar
apesar da gentil recepção.

Ah! Se soubessem a dor que mora na gentileza!
Habita mais dor na gentileza
do que na crueldade.
A crueldade é desinteressada
por anterior ser sempre
a qualquer motim que a deflagre.

Para quem ama o tudo
e detesta o nada
ser gentil
é pedir pelo mar passagem
quando se navega em armada
de força sabida.
É pedir com sorriso
e doer.
Dói a dor que doa compaixão
aos tocados pela gentileza
como bruma
mas ela é vento...
Vento!
Um vento condensado
para que se passe
entre duas nuvens
sem chover.

um vento empurra nuvens
mas não arrasta raios
de teimosia imanente
que o chão entre águas
tenta tocar
e quando toca
toca fogo
beija incinerando
muda os estados
abrupto
não volta sem avisar
sendo ele o descarrego de si
finda o corpo no próprio beijo
flameja à exaustão nula:
é energia
gentil com as nuvens
cruel com o chão
como tudo que remenda o contradito
e levita ao inverso.

falo de raios
e hoje é sol
em quais curvas andei
então a criar
nuvens em mim?

hoje é sol
só até enquanto
a água não pesa.

são gentis os raios
para quem na mata escura
caminha sem lampião
será para os vagalumes carentes
o relâmpago um deus?
cruel e gentil como um deus
que mais Deus é
quanto mais gentil for
estando sem ser

até vir o trovão
denúncia para os que ouvem
e mais nada conseguir disfarçar.